domingo, 16 de novembro de 2025

Asas da Poesia * 129 *


Poema de
APARECIDO RAIMUNDO DE SOUZA
Vila Velha/ES

Remédio ideal

Cada vazio
Existente
em minha alma
Cabe uma partícula
Que completa
Você
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Soneto de
DOROTHY JANSSON MORETTI
Três Barras/SC, 1926 – 2017, Sorocaba/SP

Dia Brusco

Plena manhã é um triste lusco-fusco
como se a tarde já tivesse entrado.
Que depressão me traz o dia brusco,
tudo cinza, sombrio, meio enlutado!

As casas vestem-se de um tom pardusco,
tudo parece velho e desbotado…
Inutilmente, em cada canto eu busco
o brilho e a cor de um dia ensolarado.

Adoro o sol. Adoro a chuva mansa
que alegre cantarola na enxurrada
e me recorda os tempos de criança.

Mas dia brusco, seco e carrancudo,
tange meus nervos e eu, mal-humorada,
só vejo sombras de velhice em tudo!
= = = = = = = = =  

Poema de
ANTONIO JURACI SIQUEIRA
Belém/PA

Que Pena...

Já não falo de mim. Não vale a pena
pois a pena que eu sentir do meu penar
é tão vã quanto as penas ressequidas
de um pássaro empalhado e tão inútil
quanto a pena da caneta que secou.

Apenas te direi que sinto pena
das penas que perdi durante o voo
no céu da solidão cumprindo a pena
imposta pela pena algoz do teu amor.
= = = = = = = = =  

Trova Popular

Muito vence quem se vence
e muito diz quem diz tudo, 
porque ao discreto pertence
a tempo fazer-se mudo.
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Dobradinha poética (trova e soneto) de
LUCÍLIA ALZIRA TRINDADE DECARLI
Bandeirantes/PR

Doce Olhar

Teu olhar, pura magia,
transmite doçura tanta,
que em mim tira a nostalgia
e qualquer medo suplanta!

Transmite o teu olhar real doçura…
Pergunto-me se existem tais momentos
em que este olhar, despido de candura,
reflete o fel de alguns maus pensamentos.

Aqueles pensamentos de amargura,
que em todos nós evocam sofrimentos,
pois não existe, creio, uma criatura
livre no mundo, sem quaisquer tormentos…

Mas este olhar, que inspira em mim confiança,
fala de amor, de paz e de esperança,
logo afugenta o meu triste pensar.

Volto a te olhar, atenta e embevecida…
Se em tuas mãos coloco a minha vida,
no teu olhar eu quero mergulhar!…
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Poema de
ANTERO JERÓNIMO
Lisboa/Portugal


Na árvore sagrada
mágica mística
berço da Criação
lugar singular
o combatente abrigou a sua fé

Ali, em partidas e chegadas
milhares depositaram as suas preces
invocando o seu deus
orando pelos seus
e pelos irmãos da guerra
que regaram de sangue a vermelha terra

Quão grande 
pode ser a fé do Homem.
Crê-se que a árvore
é uma ponte para o céu.
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Soneto de 
ANTÔNIO OLIVEIRA PENA
Volta Redonda/RJ

Soneto de aproximação

A vida, ao teu redor, vê com alegria;
nos jardins, conta as flores que se abriram;
esquece as murchas, já sem poesia,
e aquelas cujas pétalas caíram.

Retém, do lábio teu, tudo o que é bom,
e as linhas do sorriso do teu rosto;
não te deixes levar pelo desgosto,
nem digas nada em pesaroso tom.

Que saibas rir, malgrado o sofrimento;
não te incomode nunca a noite escura,
tampouco, por teu corpo, as cicatrizes...

Guarda que as nuvens as dissipa o vento,
e que a árvore que mais alcança altura
tem mais fundas, no chão, suas raízes.
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Poema de
VANDA FAGUNDES QUEIROZ
Curitiba/PR

Menino da feira

Menino da feira,
esperto e magrinho,
tão cedo na vida
perdeu seu lazer.

Carreto, moça?
Baratinho, dona!
Posso cuidar do carro, tia?

Menino insistente
pedindo com os olhos
que guardam no fundo
segredos do lar…
(Talvez o pai fugiu…
A mãe leva para fora…
Oito irmãozinhos com fome...)

Menino
sem direitos…
só deveres.
Seus pais, onde estarão?
Talvez você seja filho…
da minha própria omissão.
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Trova Funerária Cigana

A minha alma não morreu,
desfaleceu no transporte,
na ocasião do gemido
que meu irmão deu na morte.
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Soneto de 
GIOCONDA LABECCA
(Campanha/MG, 1931 – 2020, São Paulo/SP)

Aspiração

Se eu pudesse, morrer, morrer olhando,
daqui desta janela bem defronte,
o Céu, a Vargem, a Campina e o Monte,
e junto a mim a minha Mãe orando...

E a natureza toda me embalando
ao som de salmos, murmurando a fonte,
e o sol tépido e morno no horizonte
e sorrateiramente se escambando...

Ver meus irmãos em orações funéreas,
mandando aos Céus em espirais etéreas
a fumaça do incenso, espesso véu...

E eu, vendo a vida plena de esplendores,
dizer, sorrindo nos meus estertores:
— Que tarde azul para subir ao Céu!
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Poema de 
RITA MARCIANO MOURÃO
Ribeirão Preto/SP

A poesia pede silêncio

Poetar é meu jeito de estar sozinha,
esquecer o mundo e suas ameaças.
A poesia pede silêncio, recolhimento.
O silêncio me leva a exorcizar os demônios
que insistem em amordaçar a minha liberdade
de ser e de amar.
A poesia me aproxima de Deus!
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Soneto de 
JOÃO RANGEL COELHO
Juiz de Fora/MG, 1897 – 1975, Rio de Janeiro/RJ

Mãos

As tuas longas mãos alvinitentes,
despetalando rosas ao luar,
são brancas, "como dois lírios doentes"
no lago emocional do meu olhar.

Meu triste amor!... Nas horas mais pungentes
da minha vida boêmia e singular,
as tuas mãos de seda, transparentes,
teceram meu destino, a acarinhar.

Quando partiste, as tuas mãos esguias,
num derradeiro gesto de agonias,
tremularam de manso aos olhos meus

e, com saudade imensa e dolorida,
deixaram para sempre a minha vida
na balada tristíssima do adeus.
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Hino da 
Lapa/ PR

I
Junto a Dulcídio e Carneiro
No cerco da Lapa, um dia,
Mostramos ao mundo inteiro
Que a nossa gente sabia,

Pela justiça e o direito
Lá nos campos de batalha
Pelejar peito a peito
Ao rouco som da metralha

Estribilho:
Que campos verdes, que alegre terra,
Terra mais bela que esta não há:
Quantas riquezas no seio encerra
A linda terra do Paraná!

II
Como é feliz quem caminha,
Assim denodadamente,
Pronto, sempre, em linha,
Gesto firme, olhar em frente.

Bendita seja esta imagem
Da Pátria sonora e bela...
Que orgulho de ter coragem
Para poder defendê-la

Estribilho:
Que campos verdes, que alegre terra,
Terra mais bela que esta não há:
Quantas riquezas no seio encerra
A linda terra do Paraná!

III
Cair no combate e sangue
Dar pela Pátria querida,
Em ondas, o nosso sangue,
Em ondas, a nossa vida,

É uma esplêndida vitória
Que arrebata e que consola:
Dai-nos senhor, essa glória
Dai-nos senhor, essa esmola!

Estribilho:
Que campos verdes, que alegre terra,
Terra mais bela que esta não há:
Quantas riquezas no seio encerra
A linda terra do Paraná!
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Soneto de 
LILINHA FERNANDES
Rio de Janeiro/RJ, 1891 – 1981

A casa onde nasci

Era minha esta casa. Eu a conheço...
Janelas amplas... larga porta... a escada
por onde agora em pensamento desço
para ver como nasce uma alvorada.

O laranjal cheiroso, o mato espesso...
O poço onde era a roupa bem lavada.
No pátio, bem no centro, eu não me esqueço,
a amendoeira por meu pai plantada.

Dava guarda ao portão um jasmineiro
que de flor se vestia o ano inteiro
e hoje está triste e velho como eu.

Casa velha! deixaste de ser minha...
Assim, tudo que amei, tudo que eu tinha,
deixou, há muito tempo, de ser meu!
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Fábula em Versos de
JEAN DE LA FONTAINE
Château-Thierry/França, 1621 – 1695, Paris/França

O leão e o rato

Saiu da toca aturdido
Daninho pequeno rato,
E foi cair insensato
Entre as garras dum leão.
Eis o monarca das feras
Lhe concedeu liberdade,
Ou por ter dele piedade,
Ou por não ter fome então.

Mas essa beneficência
Foi bem paga, e quem diria
Que o rei das feras teria
Dum vil rato precisão!
Pois que uma vez indo entrando
Por uma selva frondosa,
Caiu em rede enganosa
Sem conhecer a traição.

Rugidos, esforços, tudo
Balda sem poder fugir-lhe;
Mas vem o rato acudir-lhe
E entra a roer-lhe a prisão.
Rompe com seus finos dentes
Primeira e segunda malha;
E tanto depois trabalha,
Que as mais também rotas são.

O seu benfeitor liberta,
Uma dívida pagando,
E assim à gente ensinando
De ser grato a obrigação.
Também mostra aos insofridos
Que o trabalho com paciência
Faz mais que a força, a imprudência
Dos que em fúria sempre estão.
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Eduardo Martínez (Santana e o retrato falado)

Santana, como de costume, chegou atrasado à delegacia. Mas nada além do que as quase duas horas de costume. Afinal, ele, segundo as suas próprias palavras, já havia feito muito para a polícia nos seus tantos e tantos anos de casa. Chegou, arrastou seu corpanzil através da portinhola que separava o público dos grandes defensores da ordem pública e, sem causar espanto nos colegas no balcão, foi direto para a cozinha tomar algumas xícaras de café. Obviamente, o Santana merecia essa pausa antes mesmo de começar a fatigante labuta.

Quase uma hora após, lá vem aquele paquiderme se sentar na cadeira ao canto, tentando não ser visto pelas pessoas que aguardavam o atendimento. No entanto, para o seu azar, uma mulher de seus lá trinta e poucos anos se sentou justamente no assento do outro lado da bancada. 

— Quero registrar um boletim!

— O que houve? - o Santana, com o mau humor costumeiro, questionou a mulher.

— Fui estuprada!

Pois bem, o Santana, até mesmo o Santana, tomou um susto e arregalou aqueles olhos, que ficaram ainda mais esbugalhados.

— O quê? Onde foi isso?

— No Rio de Janeiro!

— E por que você não registrou isso lá?

— Porque estão me perseguindo!

O Santana, talvez resgatando aquele famoso tino policial, que na verdade nunca teve, começou a imaginar que a tal mulher não fosse muito boa da cabeça.

— E isso foi onde no Rio exatamente?

— Em Copacabana!

— Onde em Copacabana?

— Na praia!

— Quando foi?

— Domingo passado!

— Domingo? Qual o horário?

— Dez horas da manhã!

— Estava fazendo sol?

— Muito!

— Provavelmente a praia deveria estar cheia de gente.

— Lotada!

O Santana já estava quase erguendo o seu enorme corpo para ir tomar mais algumas xícaras de café. Pretendia deixar aquela maluca ali mesmo falando sozinha. Mas, antes que ele o fizesse, ela disse algo que o deixou curioso.

— Se quiser, posso fazer o retrato do estuprador!

Ele ficou ali com aquela cara de espanto, como que curioso do desfecho da história.

— Você pode me arrumar uma caneta e um papel? - perguntou a mulher.

O Santana se virou para o colega ao lado e disse:

— Me dá um papel e uma caneta aí.

Já com os objetos à mão, a mulher desenhou toscamente um rosto, como aqueles que fazemos quando estamos aprendendo a desenhar ou, como a maioria de nós, continuamos a fazê-los simplesmente para demonstrar a nossa completa falta de talento.

Assim que olhou o que a mulher havia desenhado, o Santana apenas balançou a cabeça. Não havia mais nada a se fazer na delegacia naquele dia e, então, ele, utilizando a própria lógica, foi embora. Já que havia chegado mais tarde, tinha o direito de sair mais cedo.
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Eduardo Martínez possui formação em Jornalismo, Medicina Veterinária e Engenharia Agronômica. Editor de Cultura e colunista do Notibras, autor dos livros "57 Contos e crônicas por um autor muito velho", "Despido de ilusões", "Meu melhor amigo e eu" e "Raquel", além de dezenas de participações em coletânea. Reside em Porto Alegre/RS.

Fontes:
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing  

Humberto de Campos (A Filoxera)

O maior cuidado de Dona Marieta Gomes era a educação daquele filho. Horrorizava-a a ideia de possuir um rebento da sua árvore sem a noção completa da moral católica, e foi com essa preocupação que tomou, ela própria, à sua conta, a educação completa do pirralho.

— Quero que você se torne um homem como seu avô; um homem sério, formado na lei de Deus, e que seja um dia fidalgo da Santa Sé!

E assim ia sendo, mais ou menos. Sem confiança no marido, que podia manifestar informações profanas ao seu Ricardinho, ou saía madame com ele pela cidade, ou pedia ao pai, o cone Souza Viana, que saísse, levando-o a conferências, às exposições, aos lugares instrutivos. E foi em uma visita à Escola de Belas Artes, que o menino, vendo o avô parado diante de um mármore admirável representando uma beleza feminina, em tamanho natural, indagou, vivaz:

— Vovô, que folha é esta?

— É folha de parreira... - informou o ancião, a voz trêmula, puxando-o carinhosamente pelo braço...

Dias depois, passeavam Dona Marieta, o filho, e o padre Corrêa, amigo da família e padrinho do garoto, pelo jardim da grande chácara do Corcovado, quando o reverendo estacou diante de uma videira, cujas folhas haviam sido atacadas pela filoxera. Estacou, arrancou a folha, examinou-a devidamente e ia atirá-la fora, quando o Ricardinho indagou, os olhos muito vivos:

— Dindinho, que bicho é esse?

— É a filoxera, uma moléstia das parreiras... - informou, paciente, o sacerdote.

— E isso só dá nas plantas de verdade? - insistiu o menino, os olhos na cara do padre.

E como ninguém respondesse, por não ter compreendido:

— É porque o vovô quando vai comigo naquele museu, fica um tempo enorme olhando aquelas folhas que estão naquelas mulheres de pedra!
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Humberto de Campos Veras nasceu em Miritiba/MA (hoje Humberto de Campos) em 1886 e faleceu no Rio de Janeiro, em 1934. Jornalista, político e escritor brasileiro. Aos dezessete anos muda-se para o Pará, onde começa a exercer atividade jornalística na Folha do Norte e n'A Província do Pará. Em 1910, publica seu primeiro livro de versos, intitulado "Poeira" (1.ª série), que lhe dá razoável reconhecimento. Dois anos depois, muda-se para o Rio de Janeiro, onde prossegue sua carreira jornalística e passa a ganhar destaque no meio literário da Capital Federal, angariando a amizade de escritores como Coelho Neto, Emílio de Menezes e Olavo Bilac. Trabalhou no jornal "O Imparcial", ao lado de Rui Barbosa, José Veríssimo, Vicente de Carvalho e João Ribeiro. Torna-se cada vez mais conhecido em âmbito nacional por suas crônicas, publicadas em diversos jornais do Rio de Janeiro, São Paulo e outras capitais brasileiras, inclusive sob o pseudônimo "Conselheiro XX". Em 1919 ingressa na Academia Brasileira de Letras. Em 1933, com a saúde já debilitada, Humberto de Campos publicou suas Memórias (1886-1900), na qual descreve suas lembranças dos tempos da infância e juventude. Após vários anos de enfermidade, que lhe provocou a perda quase total da visão e graves problemas no sistema urinário, Humberto de Campos faleceu no Rio de Janeiro, em 1934, aos 48 anos, por uma síncope ocorrida durante uma cirurgia. Além do Conselheiro XX, Campos usou os pseudônimos de Almirante Justino Ribas, Luís Phoca, João Caetano, Giovani Morelli, Batu-Allah, Micromegas e Hélios. Algumas publicações são Da seara de Booz, crônicas (1918); Tonel de Diógenes, contos (1920); A serpente de bronze, contos (1921); A bacia de Pilatos, contos (1924); Pombos de Maomé, contos (1925); Antologia dos humoristas galantes (1926); O Brasil anedótico, anedotas (1927); O monstro e outros contos (1932); Poesias completas (1933); À sombra das tamareiras, contos (1934) etc.
Fontes:
Humberto de Campos. Grãos de Mostarda. Publicado originalmente em 1926. Disponível em Domínio Público. 
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Fernando Pessoa (No Jardim de Epíteto)

O aprazível de ver estes frutos, e a frescura que sai destas árvores frondosas, são — disse o Mestre, — outras tantas solicitações da natureza para que nos entreguemos às melhores delícias de um pensamento sereno. Não há melhor hora para a meditação da vida, ainda que seja inútil, do que esta em que, sem que o sol esteja no ocaso, já a tarde perde o calor do dia e parece que sobe vento do arrefecimento dos campos.

São muitas as questões em que nos ocupamos, e grande é o tempo que perdemos em descobrir que nada podemos nelas. Pô-las de parte, como quem passa sem querer ver, fora muito para homem e pouco para deus; entregarmo-nos a elas, como a um senhor, fora vender o que não temos.

Sossegai comigo à sombra das árvores verdes, em que não pesa mais pensamento que o secarem-lhes as folhas quando vem o outono, ou esticarem múltiplos dedos hirtos para o céu frio do inverno passageiro. Sossegai comigo e meditai quanto o esforço é inútil, a vontade estranha; e a própria meditação, que fazemos, nem mais útil que o esforço, nem mais nossa que a vontade. Meditai também que uma vida que não quer nada não pode pesar no decurso das coisas, mas uma vida que quer tudo também não pode pesar no decurso das coisas, porque não pode obter tudo. E o obter menos que tudo não é digno das almas que solicitam a verdade.

Mais vale, filhos, a sombra de uma árvore do que o conhecimento da verdade, porque a sombra da árvore é verdadeira enquanto dura, e o conhecimento da verdade é falso no próprio conhecimento. Mais vale, para um justo entendimento, o verdor das folhas que um grande pensamento, pois o verdor das folhas, podeis mostrá-lo aos outros, e nunca podereis mostrar aos outros um grande pensamento. Nascemos sem saber falar e morremos sem ter sabido dizer. Passa-se nossa vida entre o silêncio de quem está calado e o silêncio de quem não foi entendido, e em torno disto, como uma abelha em torno de onde não há flores, paira incógnito um inútil destino.
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Fernando Pessoa (1888-1935) foi um dos mais importantes poetas e escritores da língua portuguesa e uma figura central do modernismo em Portugal. Sua obra é notável pela criação de heterônimos — personalidades literárias distintas com biografias, estilos e filosofias próprias — que assinaram grande parte de sua produção. Fernando António Nogueira Pessoa nasceu em Lisboa, Portugal, em 13 de junho de 1888. Após a morte de seu pai e o novo casamento de sua mãe, a família mudou-se para Durban, na África do Sul, em 1896. Ele viveu lá até 1905, onde recebeu uma educação em inglês e começou a escrever seus primeiros poemas nesse idioma. Ao voltar a Portugal, ele se matriculou no curso de Letras, mas logo o abandonou, dedicando-se à literatura e trabalhando em várias empresas como correspondente comercial. Pessoa estreou como crítico literário em 1912, na revista Águia. Introduziu o modernismo em Portugal e tornou-se um símbolo da cultura portuguesa. Apesar de sua importância, Pessoa publicou poucas obras em vida. Seu reconhecimento pleno veio após sua morte, com a descoberta de um grande número de textos inéditos em um baú. 
A criação de diferentes identidades literárias é a característica mais marcante de sua obra. Os mais conhecidos são: Alberto Caeiro: O "mestre" dos outros heterônimos, poeta bucólico e simples, que valorizava a natureza e o empirismo, com uma filosofia antirreflexiva; Ricardo Reis: Poeta clássico e neoclássico, com referências à mitologia greco-romana e uma busca pela tranquilidade interior; Álvaro de Campos: Engenheiro naval, poeta vanguardista e futurista, caracterizado pela exaltação da vida moderna e da velocidade, mas também pelo tédio e pessimismo; Bernardo Soares: Considerado um "semi-heterônimo", autor do Livro do Desassossego, que reflete sobre a vida, o existencialismo e a solidão. 
Embora tenha tido uma vida amorosa intensa, Fernando Pessoa nunca se casou ou teve filhos. Declarava-se um cristão gnóstico, mas não se filiou a nenhuma instituição religiosa, explorando a temática religiosa em seus escritos. Faleceu em Lisboa, em 30 de novembro de 1935, aos 47 anos, devido a uma cólica hepática. 
Fontes:
Fernando Pessoa, O banqueiro anarquista e outros contos filosofais. Disponível em Domínio Público.  
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sábado, 15 de novembro de 2025

Guirlanda de Versos * 51 *


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JOSÉ FELDMAN, poeta, trovador, escritor, professor e gestor cultural. Formado em técnico de patologia clínica trabalhou por mais de uma década no Hospital das Clínicas de São Paulo. Devido à situação financeira insuficiente não concluiu a Faculdade de Psicologia, na FMU, contudo se fez e ainda se faz presente em mais de 200 cursos presenciais e online no Brasil e no exterior (Estados Unidos, México, Escócia e Japão), sendo em sua maioria de arqueologia, astronomia e literatura. Foi enxadrista, professor, diretor, juiz e organizador de torneios de xadrez a nível nacional durante 24 anos; como diretor cultural organizou apresentações musicais. Morou na capital de São Paulo, onde nasceu, em Taboão da Serra/SP, em Curitiba/PR, em Ubiratã/PR, em Maringá/PR. Consultor educacional junto a alunos e professores do Paraná e São Paulo. Pertence a diversas academias de letras, como Confraria Brasileira de Letras, Academia Rotary de Letras, Academia Internacional da União Cultural, Academia de Letras Brasil/Suiça, Confraria Luso-Brasileira de Trovadores, Academia de Letras de Teófilo Otoni, etc, possui os blogs Singrando Horizontes desde 2007, e Pérgola de Textos, um blog com textos de sua autoria, Voo da Gralha Azul (com trovas do mundo). Apaixonado por cães e gatos, assina seus escritos por Floresta/PR. Dezenas de premiações em crônicas, contos, poesias e trovas no Brasil e exterior.
Publicações de sua autoria “Labirintos da vida” (crônicas e contos); “Peripécias de um Jornalista de Fofocas & outros contos” (humor); “35 trovadores em Preto & Branco” (análises); “Canteiro de trovas”; “Pérgola de textos” (crônicas e contos), “Caleidoscópio da Vida” (textos sobre trovas) e “Asas da poesia”.

Silmar Bohrer (Croniquinha) 148

Diz a letra daquela música - "Tenho andado tão só, quem me olha nem me vê...".  

Interessante, alguém não nos vê. Na verdade a afirmação pode ser ao contrário, do outro lado - nós não "enxergamos" alguém que olha sem ter nossa atenção. E então pensamos ser infelizes.

Andamos na estrada, na rua, estamos numa reunião e não mostramos urbanidade e simpatia com alguém que possa nos dar um sorriso, uma fala, uma guarida.  Estamos enrustidos no nosso nós. Tenho visto gente de cara feia, jeito amarrado, nem uma risadinha. E aí a gente pergunta - por quê? Uma conversa não anima, uma saída não relaxa, uma caminhada não renova?

Talvez a felicidade comece por aí. Ou esteja embutida em pequenos detalhes, espírito animado, alegria nas ideias. A felicidade começa em nós. Saibamos buscá-la, construindo felicidades mútuas.

A vida pede entendimento, 
                        bom senso, 
                        alumbração.
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Silmar Bohrer nasceu em Canela/RS em 1950, com sete anos foi para em Porto União-SC, com vinte anos, fixou-se em Caçador/SC. Aposentado da Caixa Econômica Federal há quinze anos, segue a missão do seu escrever, incentivando a leitura e a escrita em escolas, como também palestras em locais com envolvimento cultural. Criou o MAC - Movimento de Ação Cultural no oeste catarinense, movimentando autores de várias cidades como palestrantes e outras atividades culturais. Fundou a ACLA-Academia Caçadorense de Letras e Artes. Membro da Confraria dos Escritores de Joinville e Confraria Brasileira de Letras. Editou os livros: Vitrais Interiores  (1999); Gamela de Versos (2004); Lampejos (2004); Mais Lampejos (2011); Sonetos (2006) e Trovas (2007).
Fontes:
Texto enviado pelo autor.
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Monteiro Lobato (O camponês ingênuo)

Era um camponês muito ingênuo, que um dia partiu para a cidade de Bagdá a fim de vender uma cabra; foi montado num jumento, a puxar a cabra, que ia, tlin, tlin, tlin, com um cincerro ao pescoço. 

Três ladrões resolveram roubá-lo.

— Eu me encarrego de furtar a cabra — disse um deles.

— E eu, de furtar o jumento — disse o segundo.

— E eu, de furtar-lhe as roupas — disse o terceiro.

Assim combinados; os três malandros seguiram o pobre camponês. O primeiro deu jeito de passar a campainha do pescoço da cabra para o rabo do burro sem que o pobre homem percebesse. Sempre a ouvir o toque da campainha, só muito lá adiante é que olhou para trás e não viu cabra nenhuma.

Desesperado com aquilo, porque aquele animalzinho representava muito para ele, pulou do jumento abaixo e pediu a um homem que viu por ali que o segurasse enquanto ele ia em procura da cabra. 

Com a maior boa vontade o homem prontificou-se a segurar o jumento — e, assim que o camponês se afastou, fugiu. Esse homem era o segundo ladrão.

Quando o camponês voltou e não encontrou nem sinal do jumento, abriu a boca, desesperado. Nisto deu com outro homem que olhava para dentro dum poço, com grande aflição.

— Que houve? — perguntou o camponês. — Perdeu também algum jumento?

— Perdi muito mais! — disse o homem com voz de desespero. — Imagine que fui encarregado de entregar um escrínio de ouro ao califa, e sentando-me à beira deste poço, para descansar, não sei que jeito dei que o escrínio caiu lá dentro.

— Por que não desce para pegá-lo?

— Já pensei nisso, mas tenho medo de resfriar-me. Sou muito sujeito a resfriados. Estou esperando que apareça alguém que queira prestar-me este serviço.

— Quanto paga? — perguntou o camponês.

— Oh, pago dez moedas de ouro, porque se trata dum escrínio riquíssimo.

O camponês não disse mais nada. Sacou fora a roupa e desceu ao poço. E o tal portador do escrínio, que não era portador de escrínio nenhum e sim o terceiro ladrão, fugiu com a roupa dele…
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— Coitado! — exclamou Narizinho. — A vida é bem cruel. Os ingênuos e os bons são sempre iludidos pelos maus.

— Verdade, sim — concordou dona Benta.

— Os homens de boa fé saem sempre perdendo. Por isso o meu bisavô, que foi o homem mais matreiro da sua zona, costumava dizer: “Quando alguém me procura para propor um negócio, eu fico ouvindo e pensando cá comigo: “Onde estará o gato?” e descubro, porque em todo negócio que alguém propõe há sempre um gato escondido.” Nesse pau tem “mé”! — dizem os caboclos.

Mas Narizinho não tirava da ideia o pobre camponês.

— Coitado! Perder a cabrinha já foi um desastre. Perdeu depois o jumento, que valia muito mais que a cabrinha. E por fim acabou nu em pelo. E por quê? Só porque teve boa fé, só porque acreditou nos três homens…

— Por isso é que eu não gosto de gente — gritou Emília. — São os piores bichos da terra. Entre as formigas ou abelhas, por exemplo — quem é que já viu uma furtando outra, ou mentindo para outra, ou amarrando outra em rabo de burro bravo? Vivem em sociedade, aos milhares de milhares, na mais perfeita harmonia. Ah, quem quiser saber o que é honestidade de vida, vá a um formigueiro ou a uma colmeia. Aqui entre os homens é que não fica sabendo disso, não. Quanto mais conheço os homens, mais aprecio as abelhas e as formigas.
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Monteiro Lobato (José Bento Renato Monteiro Lobato) nasceu em 1882, em Taubaté/SP, e faleceu em 1948, em São Paulo. Foi promotor, fazendeiro, editor e empresário. Apesar de também escrever para adultos, ficou mais conhecido por causa dos seus livros infantis. Faz parte do pré-modernismo e escreveu obras marcadas pelo realismo social, nacionalismo e crítica sociopolítica. Já seus livros infantis da série Sítio do Picapau Amarelo possuem traços da literatura fantástica, além de apresentarem elementos folclóricos, históricos e científicos.Em 1900, ingressou na Faculdade de Direito de São Paulo. Em 1903, se tornou um dos redatores do jornal acadêmico O Onze de Agosto. Escreveu também para periódicos como Minarete, O Povo e O Combatente. Se formou em Direito no final do ano de 1904. Em 1908, se casou com Maria da Pureza. Com a morte do avô, em 1911, o escritor recebeu como herança algumas terras. Assim, decidiu morar na fazenda do Buquira. Ele passou a ser conhecido quando, em 1914, sua carta “Uma velha praga” foi publicada n’O Estado de S. Paulo. Em seguida, o autor criou o personagem Jeca Tatu. Três anos depois, desistiu da vida de fazendeiro e se mudou para São Paulo. Nesse ano, publicou o polêmico artigo Paranoia ou mistificação?, que critica as tendências modernistas. No ano seguinte, comprou a Revista do Brasil. Em 1920, fundou a editora Monteiro Lobato & Cia. Cinco anos depois, vendeu a Revista do Brasil para Assis Chateaubriand (1892–1968) e decretou a falência da editora Lobato & Companhia, que, a essa altura, já se chamava Companhia Gráfico-Editora Monteiro Lobato. Ele se tornou sócio da Companhia Editora Nacional. Se mudou para o Rio de Janeiro, em 1925. Dois anos depois, foi para Nova York, onde assumiu o cargo de adido comercial. Em 1929, devido à crise econômica, vendeu suas ações da Companhia Editora Nacional. No final de 1930, quando Getúlio Vargas (1882–1954) subiu ao poder, o escritor perdeu seu cargo de adido comercial. Retornou ao Brasil no ano seguinte. Em 1932, foi um dos fundadores da Companhia Petróleo Nacional. Anos depois, em 1941, o autor ficou preso, durante três meses, por fazer críticas ao regime ditatorial de Getúlio Vargas. Se tornou sócio da Editora Brasiliense, em 1946, ano em que decidiu morar na Argentina, onde foi um dos fundadores da Editorial Acteón. Voltou ao Brasil em 1947 e fez críticas ao governo de Eurico Gaspar Dutra (1883–1974). Em 1922, decidiu concorrer à cadeira número 11 da Academia Brasileira de Letras. Porém, desistiu da candidatura por não querer “implorar votos”. Já em 1926, voltou atrás e, novamente, concorreu a uma vaga na ABL, mas não foi eleito. Por fim, em 1944, recusou indicação para a Academia, em protesto por Getúlio Vargas ter sido eleito à Academia Brasileira de Letras em 1941

Fontes:
Monteiro Lobato. Histórias de Tia Nastácia. Publicado originalmente em 1937. Disponível em Domínio Público.  
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Manuel de Oliveira Paiva (Corda sensível)


Um fardão de coronel estava enfiado sobre o espaldar da cadeira de balanço, e a pequena Maria, apertando na mão uma fatia de pão com manteiga, olhava extasiada. A cor azul escura da casimira (tecido leve de lã), sob a claridade noturna que enchia a sala, modelava macieza de veludo e fingia reflexos de roxo. Nas ombreiras do fardão pousavam as dragonas maciças, de grande gala, com o seu chuveiro de torçais de ouro; e na frente o papo se escancarava, deixando ver a tela de crochê, com que se costuma proteger as mobílias. A um lado corriam-lhe os oito botões, cada um crescido como um olho-de-boi...

Mas, quando a pequena deu com o empastamento de condecorações que encobria lado a lado o peito ao fardão, não pôde resistir ao chamariz, e pondo um joelho à beira do assento e com os bracinhos estirados agarrando-se aos braços da cadeira, subiu, apesar do balanço. As mangas da farda começaram então um movimento de pêndulo, roçando no tapete os canhões encastoados pelas pesadas divisas de coronel. O amor ao equilíbrio forçou a pequena Maria a ir com a mão ao topo da cadeira, e aí, olha lá manteiga pelas abas.

Acode naquela cabecinha castanha uma ligeira ideia de remorso, e o que há de mais simples é deixar as coisas como estavam. A esse tempo brilhavam no escuro da rua, à altura do peitoril da janela, os olhos da filha do cabo de ordens, que espiava para dentro, pode ser que arrastada pelo cheiro da ceia, cujos tirlintintins se ouvia. Que ótimo desvio! E as duas começaram a conversar-se na janela, como pessoas sisudas; bem entendido, a pequena do cabo de ordens comendo o enfastiado pão com manteiga, a célebre fatia.

No dia seguinte, quando a criada veio sacudir os móveis, caiu das nuvens, coitada! Cada rombo deste tamanho, afora uma porção de rendinhas, na casimira do fardão, de modo que a intertela e os recheios do peitilho estava tudo estripado e esbrugado.

Consequência: um ódio entranhado aos ratos. Os cantos da casa povoaram-se de ratoeiras. Era um nunca acabar.

Pois, senhores, roerem a mais linda, a mais garbosa, a mais rica, a mais nobre farda da província?! Ah! se o coronel pudesse estrepar toda a ratagem unânime das nações na ponta de seu gládio!

Em um amanhecer de abril, sofrivelmente belo, a criada, deixando para mais tarde a visita às ratoeiras, aconteceu que ajuntaram-se à pequena Maria o pequeno Manuel e o caçula, e foram despescar, por sua conta e risco, as da despensa.

O cabeça do motim, que todos sabem ser a senhora dona Maria, como lhe chama a mãe quando se enfeza, não teve mais o que fazer, e, cercada pelos dois bargados consócios (companheiros espertos), assentou-se no chão, depondo a ratoeira sobre o pano do vestido que se fazia entre as duas perninhas abertas.

A ratoeira não era mais de que uma cúpula de arame cozida a uma rodelazinha de pinho. Dentro, porém, havia era um bicho cinzento e uma porção de bichinhos vermelhos, da cor dos dedinhos do caçula: fenômeno raro, que provocou uma gritaria hilariante, aliás inconveniente, porque atrás acudiram a criada, a mamãe e até o coronel, a ver o que fazia aquela troça de quenquéns.

Maria estava metendo a mão para abocanhar a bicharada — em tempo de ser mordida! — e o Manuel procurava também se havia outro buraco onde ele pudesse meter a dele.

— Virgem Maria! — vozeava a criada.

— Isto é o diabo! — roncava o coronel.

Recuaram todas as mãos, e a curiosidade das criancinhas foi achar nos olhos delas o desejado e inviolável refúgio.

A mamãe, porém, encarando o caso, juntou as mãos enternecidamente, e, cobrindo o marido e os três filhinhos com um daqueles olhares que só em mulheres se depara, exclamou cheia de profundo sentimento materno:

— Espera, que é uma ratinha que deu à luz na ratoeira!

O duro militar ficou embasbacado. Enquanto a rata puérpera, impunemente, pacatamente, com o salvo-conduto de sua boa estrela de mãe, saía, como um anão no meio de enormes gigantes de conto de fada, e galgava novamente as prateleiras prenhes de queijo. A ninhada se amontoava no regaço da pequena Maria, — uma porção de bichinhos vermelhos, da cor das carnes tenras do caçula, cujo corpinho nu estava ali acocorado, a alma de criança aberta nuns olhos admirativos, exclamando Com jubilosa admiração:

— Uói! — apontando para os ratinhos com o dedinho vermelho.
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MANUEL DE OLIVEIRA PAIVA (Fortaleza/CE, 1861 – 1892) foi um escritor cearense. Colaborou no periódico A Quinzena, publicação da agremiação cearense Clube Literário, do qual participavam João Lopes, Virgílio Brígido, Justiniano de Serpa, entre outros. Também publicou no jornal carioca A Cruzada e O Libertador, órgão da Sociedade Libertadora Cearense, período em que pública dois poemetos (Zabelinha ou a Tacha Maldita e 25 de Março) e um romance (A Afilhada). Sua obra de maior renome, Dona Guidinha do Poço, foi publicada postumamente, em 1952, por inciativa da pesquisadora e crítica literária Lucia Miguel Pereira. Cursou o seminário do Crato, mas trocou a vida eclesiástica pela militar, indo estudar na Escola Militar do Rio de Janeiro, retornando à terra natal em 1883, devido a problemas pulmonares. Teve participação ativa na campanha abolicionista, colaborando no jornal Libertador. Destacou-se, também, como membro do Clube Literário. Sua única obra publicada em vida foi A Afilhada, novela que saiu em folhetins no Libertador em 1889. Neste jornal e em A Quinzena saíram alguns de seus poemas abolicionistas e seus contos realistas. Em livro, porém, seus escritos só seriam publicados postumamente, algumas dezenas de anos depois da sua morte. Sua obra-prima, Dona Guidinha do Poço, escrita em 1892, é um dos maiores romances do Naturalismo brasileiro e possui uma história interessante: seus originais foram entregues pelo próprio autor ao amigo Antônio Sales, que entregou uma cópia a Lopes Filho, que a perde, e outra a José Veríssimo, que iniciou a publicação, interrompida com a falência da sua Revista Brasileira; no fim dos anos 40, porém, Lúcia Miguel-Pereira encontra uma cópia com Américo Facó, depois de intensa pesquisa. Ela publicou, finalmente, Dona Guidinha do Poço em 1952. A Afilhada ganhou edição em livro em 1961, e seus contos foram publicados pela Academia Cearense de Letras em 1976.

Fontes:
Manuel de Oliveira Paiva. Contos. Publicado originalmente em 1888. Disponível em Domínio Público.
Biografia = https://pt.wikipedia.org/wiki/Manuel_de_Oliveira_Paiva 
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